Reclamações existem de ambos os lados, mas todos têm muito a ganhar com um relacionamento sadio.
Não é incomum ouvir reclamações de clínicos veterinários sobre a Indústria. Já ouvi muitos colegas questionarem a atuação das empresas junto aos prescritores dos seus produtos (ou seja, nós veterinários). Que não são devidamente valorizados, que muitas vezes as empresas “atravessam” suas atribuições, recomendando ao consumidor final diretamente o que devem usar, que vacina é melhor, e por ai vai a discussão… Num recente trabalho que realizamos com a nossa empresa (a Quiron Comunicação) no qual precisamos contar com a parceria de algumas clínicas, abordamos vários proprietários destes estabelecimentos para que aderissem a um estudo que estávamos conduzindo para um laboratório. Não foram poucos os que se recusaram a participar (apesar das vantagens oferecidas para quem participasse do ensaio clínico) alegando que nunca recebiam dos laboratórios mais do que pressões para que usassem e/ou prescrevessem seus produtos.
Por outro lado, a Indústria também tem lá suas queixas dos clínicos. As mais recorrentes são sobre assuntos polêmicos como a prescrição de medicamentos destinados a uso humano, sobre o uso de medicamentos manipulados, entre outras “reclamações”.
Mas quem tem razão nesta estória toda? Bom, já dizia o filósofo Aristóteles que a virtude esta no meio-termo. Ou como diria a minha e a sua avó, nem tanto ao céu, nem tanto a terra. Vamos analisar a questão sob um prisma um pouco mais amplo.
O mercado está mudando. Isto ninguém pode negar. A realidade, tanto para clínicos como para a Indústria, não é a mesma de cinco anos atrás. Tanto veterinários como a Indústria, devem rever alguns pontos em suas posições. Profissionalismo e orientação para o mercado são as palavras de ordem. Se quisermos que o segmento Pet como um todo cresça e adquira cada vez mais importância, todos os envolvidos devem se preocupar em atender efetivamente as demandas dos consumidores por mais valor nos produtos e serviços que adquirem. E isso pede por uma re-avaliação das posições de ambas as partes.
Por um lado, devemos aqui defender a posição da Indústria, no seu clamor pela “abolição” das práticas de prescrição de produtos destinados a humanos e os manipulados. Por quê? É simples. Você prescreve produtos manipulados? Bom, não sei se é do seu conhecimento, mas existe uma intensa e efetiva fiscalização sobre as Indústrias para que as fontes de matéria prima que elas utilizam sejam confiáveis, para que elas realmente “entreguem” o efeito desejado aos consumidores. Você realmente pode garantir que a receita que você passou para ser manipulada vá ser executada com ingredientes e princípios ativos eficazes e confiáveis, de forma a garantir o efeito desejado? Caso você venha a ser questionado por um dos seus clientes quanto ao efeito de um tratamento prescrito, você acha que seria mais seguro para você clínico, discutir este eventual problema com uma farmácia ou com uma empresa que tem como o seu core business, ou seja, o seu principal negócio, o mercado veterinário? Isso sem falar em todos os efeitos multiplicadores que os investimentos em marketing e comunicação feitos pelas Indústrias do setor veterinários têm sobre o movimento de nosso mercado como um todo… E experimente você ligar para o SAC de um laboratório humano para reclamar sobre eventuais efeitos adversos que um tratamento que você prescreveu esteja apresentando. Eles simplesmente dirão que o uso animal não está prescrito em bula e que você prescreveu o medicamento por sua conta e risco. E você que se entenda com seu cliente insatisfeito…
Em defesa dos clínicos devo que dizer que muitas empresas realmente precisam repensar algumas de suas estratégias de comunicação e relacionamento com a classe. O tempo de simplesmente promover produtos já passou. O momento pede ações que efetivamente constituam-se em ferramentas que gerem valor para os clínicos e para a sua atividade. A Indústria deve cada vez mais procurar promover ações que possam trazer oportunidade para o Clínico melhorar e aperfeiçoar a sua relação com os seus clientes. Iniciativas que contemplem o treinamento e atualização dos veterinários; a capacitação das equipes de atendimento das clínicas e Pet Shops; a educação dos consumidores sobre a relevância e a necessidade do acompanhamento veterinário, certamente serão apreciadas, respaldadas e potencializadas pela classe. Já tivemos a oportunidade, no decorrer de nossas atividades, de planejar e implementar algumas ações que forneciam aos veterinários ferramentas efetivas para incrementar seus negócios. E os resultados foram excelentes, tanto para os colegas, como para a Indústria patrocinadora.
Para concluir, gostaria de deixar para a reflexão de todos, mais uma frase de um filósofo. O pensador Lao-Tsé disse “Aquele que não tem confiança nos outros, não lhes pode ganhar a confiança”. Talvez seja o momento de todos os envolvidos nesta luta por promover a profissionalização e o crescimento do segmento Pet deixarem de lado as desconfianças e desavenças, e encontrarem, em conjunto, maneiras de avançar. Afinal, o mesmo pensador também disse que “Uma longa viagem de mil milhas inicia-se com o movimento de um pé!
Bons negócios!
Ricardo Osorio de Oliveira
Médico veterinário formado pela USP, com mestrado pelo ICB-USP. Desde 2001 é proprietário da Quiron Comunicação & Conteúdo, editora e agência de publicidade dedicada ao mercado veterinário e agronegócio. É palestrante na área de Marketing para o agronegócio. Atualmente é doutorando na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).